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Brasil um pais produtor e exportador de armas

FONTE: n’A Pública AGÊNCIA DE REPORTAGEM E JORNALISMO INVESTIGATIVO http://apublica.org/2012/01/brasil-produtor-exportador-de-armas/
Resumo desta reportagem realizado pela coordenadora de controle de armas do Instituto Sou da Paz Alice Andrés Ribeiro
n’A Pública reportagem especial sobre a indústria de Armas no Brasil, do jornalista Daniel Santini.
Seguem abaixo trechos interessantes:
Levantamento das principais informações contidas na série de reportagens especiais da Pública, lançadas em 27/01/2012
 
Parte 1: Brasil – produtor e exportador de armas:
·        Segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), o valor das exportações de armas leves triplicou nos últimos cinco anos: foi de US$ 109, 6 milhões em 2005 para US$ 321,6 milhões em 2010 (em 2011, houve um recuo para US$ 293 milhões). Contando apenas as armas de fogo, a quantidade impressiona. Foram 4.482.874 armas exportadas entre 2005 e 2010, segundo um levantamento inédito do Exército feito a pedido da agência Pública. Ou seja: 2.456 armas por dia.
·        Em 2011, o Brasil foi o 4º maior exportador mundial de armas leves, atrás apenas dos Estados Unidos, Itália e Alemanha. (Small Arms Survey)
·        No ranking de armamentos pesados, somos o 14º, de acordo com o Instituto Internacional de Estudos da Paz de Estocolmo (SIPRI). Nos dois casos a liderança é dos Estados Unidos, com larga vantagem.
·        Pouco se sabe sobre o destino dos armamentos fabricados no Brasil e não há nenhum debate público sobre isso. A regra, nesta indústria, é a falta de transparência.Não existe nenhuma estimativa oficial sobre a produção de armas leves no Brasil. A indústria não informa o quanto produz, e – diferentemente de outros países – não há nenhum banco de dados do governo a esse respeito. Quando se trata de comércio internacional, a transparência é ainda menor.
·        “O Brasil não publica nenhum relatório anual sobre exportação de armas e geralmente relata ao UN Register que houve ‘zero’ exportações de armas leves”, diz um relatório publicado em junho de 2010. “Os dados da alfândega não informam quantas licenças foram expedidas e quantas foram recusadas (…). No nível regional, o Brasil é o menos transparente”.
·        Muitas vezes o Small Arms Survey tem que usar dados declarados pelos importadores para realizar sua avaliação anual. Os resultados muitas vezes são superiores aos declarados pelo Ministério do Desenvolvimento. Em 2007, por exemplo, o relatório estimou as vendas de armas leves brasileiras em 234 milhões de dólares, enquanto o MDIC estima que tenha sido de 201 milhões. Em 2008, o valor do Small Arms Survey é de 273 milhões, enquanto o MDIC estima que tenha sido 260 milhões de dólares. Como não existe legislação ou um órgão internacional que monitore esse comércio, não há uma base de dados mundial, e nenhum país é obrigado a reportar-se a ninguém. Os dados do UN Register são enviados de maneira voluntária.
Parte 2: Empresas de armas miram na África e na Ásia para ampliar exportações: http://apublica.org/2012/01/empresas-de-armas-miram-africa-asia-para-ampliar-exportacoes/
·        O mercado global de armas leves movimenta mais de 7 bilhões de dólares por ano. O Brasil está entre os seis países do mundo com exportações anuais superiores a US$ 100 milhões segundo pesquisa recente do mesmo instituto.
·        O destino de metade dos revólveres, pistolas e fuzis brasileiros é os Estados Unidos, o maior importador de armas leves do mundo. As armas brasileiras, em especial as da empresa Taurus, são vendidas à polícia americana e ao varejo, que as comercializa para os cidadãos comuns.
·        A Taurus, fundada em 1937, é a principal responsável pela posição de destaque do Brasil no setor de armas leves. Desde 1983, a empresa gaúcha atua nos Estados Unidos através de uma subsidiária em Miami, a Taurus International Manufactoring. As pistolas de calibre 22 e 25 são o carro chefe das vendas da Taurus, que obteve receita líquida de R$ 671,6 milhões em 2010. Mais da metade do faturamento da empresa vem das exportações. Nos primeiros nove meses de 2011, obteve uma receita líquida de R$ 443,7 milhões: R$ 239,1 milhões do mercado externo e R$ 204,6 milhões do mercado interno. A empresa não divulga dados sobre produção nem informações detalhadas sobre contratos de exportação. Sua página na internet informa apenas que exporta para mais de 70 países.
·        Levantamentos feitos pela Iniciativa Norueguesa em Transferência de Armas Leves (Nisat, do inglês Norwegian Initiative on Small Arms Transfers) apontam que, de 1999 a 2009, o Brasil vendeu armas para África do Sul, Algéria, Angola, Botswana, Burkina Faso, Costa do Marfim, Egito, Gana, Guiné, Quênia, Madagascar, Malawi, Mauritânia, Marrocos, Namíbia, Níger, Nigéria, Paquistão, República do Congo, Senegal, Tanzânia, Uganda, Zâmbia e Zimbábue.
Outro motivo para a busca de outros mercados é a política de desestímulo às exportações para países vizinhos com o objetivo de combater o contrabando. Desde 2001, o Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) impõe uma taxação de 150% nas exportações de armas leves e munições – com exceção das que se destinam às forças de segurança – para América do Sul, Central e Caribe. Apenas a Argentina, o Chile e o Equador estão livres dessas taxas.
·        Uma olhada mais atenta nos números das exportações brasileiras fornecidos pelo MDIC mostra que o Brasil realizou exportações para países como:
Paquistão, palco de uma guerra contra talibãs na fronteira com o Afeganistão (US$ 1,5 milhão em 2011)  
o Sri Lanka, que em 2009 encerrou uma longa guerra civil marcada pela violência dos combates contra rebeldes da etnia Tamil (naquele mesmo ano, a venda de armas brasileiras ao país superou US$1,5 milhão)
Honduras, cujo governo democraticamente eleito foi derrubado em 2009 por um golpe militar (no ano anterior, as exportações de armas do Brasil somaram US$1,1 milhão)  
a Tunísia, cujo ditador Ben Ali, no poder desde 1987, foi deposto no ano passado por manifestações populares  (em 2011, as vendas de armas brasileiras foram de US$ 2,5 milhões)
Israel (exportações no valor de US$ 2,3 milhões em 2010 e US$ 1,2 milhões em 2011)
os Emirados Árabes (US$ 1 milhão em 2010), conhecidos pela repressão às liberdades civis  
Filipinas, onde confrontos entre o exército e rebeldes muçulmanos atingem milhares de civis, em especial no sul do país (foram US$ 3,8 milhões de dólares em armas em 2010 e US$ 7,5 milhões em 2011)    
o Iêmen, cujo presidente Ali Abddulah Saleh, que está há 33 anos no poder, combateu com violência os diversos protestos da população em 2011 (US$ 1,7 milhão em 2007)
Trinidad e Tobago, onde, no ano passado, foi decretado estado de emergência, com toque de recolher às 23h, por causa da violência das gangues que traficam drogas e armas (US$4,1 milhões em 2010).
·        A indústria estabeleceu, em março de 2009, os seguintes mercados como prioritários: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Venezuela, Equador, Peru e México, na América Latina; África do Sul, Angola, Namíbia, Tunísia e Zimbábue, na África; Arábia Saudita, Emirados Árabes, Kuwait, Marrocos, Oman, Qatar, no Oriente Médio; Indonésia, Malásia, Paquistão, Sri Lanka e Tailândia, no Extremo Oriente.
O mesmo documento lista as posições mantidas pelo MRE em cada país que podem ser usadas para apoio à empreitada comercial: embaixadas, consulados ou escritórios de representação.
Ou seja, permanecem como alvo os mercados de países como o Zimbábue, que tem pior IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do mundo e campeões de violações de direitos humanos como a Arábia Saudita – em seu relatório mais recente, a Anistia Internacional, acusa o governo saudita de reprimir e torturar cidadãos que fazem qualquer tipo de oposição ao governo, além de realizar intervenções militares em países vizinhos como o Bahrein e o Iêmen.
Parte 3: Em 5 anos, 4,5 milhões de armas nas ruas: http://apublica.org/2012/01/em-cinco-anos-45-milhoes-de-armas-nas-ruas
Em outubro do ano passado, o governo federal anunciou que pretende incentivar a instalação de um “pólo industrial” ligado à indústria da defesa no ABC paulista. O anúncio foi feito pelo assessor especial do ministério da Defesa, José Genoino, e pelo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Luciano Coutinho, durante um seminário sobre o tema em São Bernardo do Campo.
O banco estuda linhas específicas de crédito para empresas do setor que se instalarem na região. As novas medidas de fomento à indústria do setor de armamentos devem ser anunciadas pelo BNDES em meados deste ano.
O financiamento do BNDES ao setor é polêmico. Para os críticos da indústria de defesa, os fabricantes de armas e munições não devem se beneficiar do mesmo tratamento dado a outros setores industriais.
Quase 40 mil pessoas morreram em 2009 no Brasil em episódios relacionados a armas de fogo – incluindo homicídios, suicídios e acidentes – segundo os dados mais recentes disponibilizados pelo Ministério da Saúde.
·        Procurado pela reportagem, o Ministério da Defesa informou através da sua assessoria que “tem feito gestões a entidades de fomento, como BNDES e FINEP, com o intuito de disponibilizar financiamento para empresas que se enquadram na chamada indústria de defesa”. O BNDES informa que entre 2009 e 2011, fez empréstimos no valor de R$ 71 milhões para empresas do setor. A maior beneficiária foi a CBC – Companhia Brasileira de Cartuchos, seguida pela Forjas Taurus SA.
Entre 2005 e 2010, as vendas dobraram no mercado interno. O número de unidades vendidas passou de 469.097 em 2005 para 831.616 em 2010, incluindo um pico de 1.001.549 em 2009.
Ao todo, foram vendidas 4.339.846 armas leves no Brasil nestes cinco anos, uma média de 2.377 armas comercializadas por dia. Todas de fabricação nacional. Quanto às importadas, foram 14.142, segundo o Exército. Nesse período a Taurus comercializou 2,9 milhões de armas no país. A comparação ano a ano mostra que as vendas mais do que triplicaram em cinco anos – foram de 220 mil armas vendidas em 2005 para 775 mil em 2010. O levantamento do Exército inclui apenas armas leves – sobretudo pistolas, revólveres e fuzis de fabricação nacional. Não contabiliza armas mais sofisticadas, usadas principalmente pelas Forças Armadas, em que predomina a tecnologia importada. Os dados que indicam a expansão das vendas são inéditos até mesmo para o Ministério da Defesa.
Embora em menor escala, no Brasil também acontece o mecanismo de “revolving door”, ou porta giratória, como são chamadas nos Estados Unidos as rotineiras contratações de autoridades do governo por indústrias de armamento e vice-versa – o vice de Bush, Dick Cheney, por exemplo, era CEO da empresa Halliburton antes de assumir o cargo.
Por aqui, o general Antônio Roberto Nogueira Terra, que durante seis anos foi chefe da Diretoria de Fiscalização de Produtos Controlados (DFPC) do Ministério da Defesa – órgão responsável por autorizar a exportação de armas e munições para outros países –, passou para o outro lado do balcão ao assumir o cargo de consultor especial da Sulbras Consultoria e Assessoria Ltda, escritório derepresentação da Taurus em Brasília que pertence a Renato Conill, vice-presidente da empresa. A mudança de emprego do general foi assunto de uma reportagem da revista IstoÉ, em 2004.
Parte 4: A bancada da Bala: http://apublica.org/2012/01/bancada-da-bala
A indústria de armas, incluindo aí a ANIAM, a CBC e as empresas Taurus, doou quase R$ 2,5 milhões a campanhas de parlamentares. [No artigo eles fizeram um perfil de cada congressista que recebeu mais de R$50 mil da Indústria, e os questionaram sobre isso. Muito interessante!].